Conversas & Carreiras 

Carlos Filipe Oliveira

Partner – Stanton Chase

Pode falar-nos sobre o seu percurso profissional?
Iniciei a minha actividade profissional como Advogado Estagiário, tendo como patronos os Dr. Máximo Dias e Dr. Fonseca Macedo (de 1988 a 1990). De 1990 a 1992, estive na Triudus, com a função de Coordenador de Equipa, no então Departamento de Informática Profissional – DIP. Paralelamente, entre 1991 a 1994, prestei apoio e consultoria jurídica na Cedac, Centro de Estudos e Animação Cultural, C.R.L. Iniciei a minha actividade na gestão de recursos humanos na minha empresa de referência, pelas boa práticas que já tinha na altura, a Whirlpool Portugal Eletrodomésticos, Lda., onde desempenhei a função de Manager de Recursos Humanos, entre 1992 e 1998. De 1998 a 2000, estive na Cimpor, Cimentos de Portugal S.G.P.S., com a função de Técnico Superior de Recursos Humanos. De 2000 a 2006, assumi a função de Director de Recursos Humanos, na Cabovisão, Televisão por Cabo, S.A. Em 2007, estive num projecto de consultoria de RH, em Angola, com a função de Consultor Sénior. De 2007 a 2008, estive na 3C – Customer Contact Center, S.A., onde assumi a função de  Director de Recursos Humanos. De 2009 a 2013, desempenhei a função de Consultor de Recursos Humanos e de Coach. Desde 2013, sou Partner, na Stanton Chase Portugal, desenvolvendo a minha actividade em projectos de Executive Search, Executive Coaching e de Talent Management.

Quais os factores atitudinais que mais aprecia nos candidatos, de forma transversal? E no que toca aos chamados “soft skills”, quais lhes parecem mais críticos, face às características actuais das organizações, das formas de organização do trabalho, etc.?
Uma primeira atitude crítica e que muito aprecio num candidato é a genuinidade, pessoas que se mostram como são, para o melhor e para o pior, sem subterfúgios ou sem querem parecer o que não são. Um recrutamento votado ao fracasso é o que se baseia em competências que se julga que um candidato tem, não tendo – com o tempo, as aparências desaparecem e fica o que é estrutural da pessoa. Também a humildade é algo importante (sem se confundir com baixa auto-estima). É uma atitude que possibilita assumir de forma assertiva que não se sabe tudo, que se podem cometer erros e que aprendemos com eles, na antiga lógica Socrática “só sei que nada sei”. É algo que é potenciador de uma atitude construtiva e positiva, e potenciador de um ambiente colaborativo.  Cada vez me parece mais crítica a versatilidade como uma competência, de modo que nos permita abordar diferentes contextos culturais, em empresas diferentes, sem se perder o seu ADN, sem perder a sua identidade, ganhando uma capacidade alargada de interacção com pessoas que tenham estilos de comunicação e de estruturação de pensamento diferentes. Um outro traço de personalidade marcante é a ambição, a que eu gosto de chamar “inquietude”, para não se acomodar, para querer fazer mais e melhor, para se transcender e, muitas vezes, sair da sua “zona de conforto” natural, o que potencia a evolução pessoal e profissional de quem a tem. Uma outra característica interessante, e que muitas vezes não é verbalizada, é o bom humor, a jovialidade, percebe-se que é um facilitador nas interacções com os outros, as pessoas que o possuem são capaz de serem, mais facilmente, catalisadores de vontades e de conseguir consensos através de uma atitude positiva e construtiva. O sentido de missão e de responsabilidade, que se pode resumir no inglesismo “ownership”, é cada vez mais um factor diferenciador de quem está numa empresa ou organização de forma empenhada, dedicada e alinhada com a sua cultura e valores. O valor acrescentado para uma organização de pessoas motivadas e interessadas é uma dos activos intangíveis que não se conseguem quantificar economicamente, mas cujo valor se sente de forma indelével no desempenho da  organização e nos níveis de satisfação e de motivação – saber activar e saber manter, em si e nos outros, é uma fortíssima chave para o sucesso. Por último, outro factor crítico para as empresas é a resiliência, porque as dificuldades são uma constante da vida e, devido ao ritmo competitivo das  empresas cada vez mais acelerado, esta competência é cada vez mais uma capacidade determinante na forma como que se lida com o insucesso e a adversidade quotidianas, continuando um caminho evolutivo.
Por outro lado, muitos executivos de topo ambicionam hoje um tipo de relação laboral diferente da que experimentaram no passado, que lhes permita ter mais tempo livre e/ou dedicar mais tempo a actividades complementares, sejam elas profissionais, académicas ou pessoais. Desta forma, a contratação de executivos para projectos, e não para posições “sem termo”, ou em part-time, são tendências evidentes, no mundo corporativo. Há estudos que referem que, em 2020, (amanhã, praticamente) 50% da força de trabalho será constituída por profissionais liberais / freelancers/ empresários em nome individual / empreendedores. As organizações terão de se ajustar a esta nova realidade e, consequentemente, a nossa indústria também.

A sua experiência pessoal, enquanto recrutador profissional, mostra-lhe alguma lacuna fundamental, em termos de “skills” e/ou competências, no nosso mercado de talento?
O mercado de trabalho é um mercado segmentado e não havendo propriamente um único mercado, mas vários mercados, a sua segmentação implica que haja uma diferenciação nos perfis que se recrutam, de acordo com os níveis de responsabilidade a que pertencem. Atendendo a que o nosso recrutamento é dirigido para funções de “C level”,  funções de “top management”, os “skills” que se procuram são, cada vez mais, de bons líderes, líderes mobilizadores de emoções, capazes de serem inspiradores de um bom desempenho colectivo e em equipa, de modo a que se potenciem desempenhos excelentes. Como gestores,  é necessário que sejam profissionais que tenham visão e pensamento estratégico, com uma boa capacidade de estruturação de processos e de organizar. Acima de tudo, que saibam fazer uma boa leitura dos factores críticos de sucesso do negócio,  que os consigam potenciar e desenvolver. Procuram-se profissionais que estejam a acompanhar as novidades e alinhados com as novas tendências do mercado, de modo que consigam ter a melhor resposta, a mais actualizada, para as situações e os desafios que lhes são colocados, numa economia em rápida mudança. Fruto do ritmo acelerado em que a actividade das empresas se processa, cada vez mais se exige que estes profissionais sejam um agente da mudança,  capazes de levar uma empresa, ou um seu sector,  a serem criativos, diferenciadores, que se consigam identificar os meios mais eficientes ou as soluções mais eficazes para cada caso, do mais simples ao mais complexo e estruturante. Em termos tecnológicos, cada vez mais se procuram “Gestores 4.0”, gestores que sejam sensíveis à forma como as novas tecnologias podem ser um factor determinante para alavancar o nível de sofisticação e a qualidade do serviço prestado aos clientes para níveis superiores de performance e de evolução. No entanto, sendo o perfil de competências formado por competências “hard” (técnicas) e competências “soft” (comportamentais), é cada vez mais marcante e determinante a capacidade dos candidatos de saberem gerir a sua IE – Inteligência Emocional, mais propriamente dito a empatia, sendo este o factor primeiro e último, na aferição da adequação de um candidato a uma organização ou projecto.

É comum ter candidatos, de nacionalidade portuguesa mas residentes no estrangeiro, fruto da emigração qualificada, nestes anos mais recentes? São diferentes, de algum modo, dos candidatos que entrevista e que não passaram por essa experiência?
Tendo como clientes multinacionais estrangeiras que se instalam em Portugal e empresas portuguesas que se internacionalizam, é frequente termos projectos em que procuramos candidatos portugueses que estejam no estrangeiro ou que tenham tido um percurso internacional. De uma forma geral, os candidatos que estejam a desempenhar funções no estrangeiro ou que tiveram experiências internacionais possuem, em regra, como factor mais diferenciador,  uma significativa capacidade de adaptação, versatilidade e flexibilidade na liderança de equipas. Devido a uma experiência rica na liderança de equipas multinacionais e multiculturais, com diferentes mindset profissionais, são pessoas que sabem adequar o seu estilo de liderança de modo a activar  factores de motivação diversos e também a esbater os obstáculos culturais, de convicções e crenças, inerentes a culturas regionais diversas. A própria gestão e interacção com outras culturas, por vezes muito diferentes, condicionam a forma de gestão. Gerir na Europa é muito diferente de gerir na Ásia, por exemplo – desde a forma como se constroem relações profissionais até ao modo de se desenvolverem negócios, existem diferenças no “modus operandi” com contornos tão diversos que, se não os compreendermos, tal pode fazer toda a diferença entre o sucesso e o insucesso. Por isso, são, em regra, candidatos com “mundo”, que denotam um elevado grau de autonomia e uma forte capacidade de execução, em contextos culturais diversificados, adversos ou difíceis.

Quais os principais conselhos de gestão de carreira que gostaria de transmitir a quem nos lê?
Cada profissional constrói uma reputação, adquire um capital de experiência e constrói uma imagem profissional, como se fosse uma  impressão digital personalizada e única. Há que saber como é queremos ser conhecidos, que imagem temos, que imagem queremos fazer passar e ter a capacidade de perceber o que é importante para nós, no nossos percurso profissional. É, por isso, importante ter claro o que valorizamos, se a  capacidade de evolução, ou a aquisição de conhecimento, o estatuto, o projecto ou o nível salarial ou ainda o equilíbrio vida pessoal / profissional. Uma carreira, ou um percurso profissional, é uma corrida de fundo que durará 40/45 ou mais anos, com várias etapas. A  forma como nos vamos posicionando, em cada etapa da nossa carreira, as funções que vamos desempenhando e as empresas onde temos vivências profissionais são marcos na nossa vida e que vão, em conjunto, construindo a nossa “empregabilidade”, diferenciadora dos demais candidatos. Como qualquer actividade, é importante pensar numa estratégia adequada e planear a sua execução, para procurar projectar e antecipar para onde queremos evoluir, qual será o próximo passo, etc. Cada vez mais fundamental e marcante é o investimento que fazemos na nossa formação académica e profissional complementar à nossa formação de base, porque, sabendo que a vida nem sempre nos pergunta o que queremos, importa ter as competências necessárias para agarrar as oportunidades que nos surgirem, de modo a que, como um amigo me disse, a oportunidade se conjugue com a capacidade.