Conversas & Carreiras 

Joana Proença de Carvalho

Partner – SIGNIUM

Pode falar-nos sobre o seu percurso profissional?
Desde 2017, e por parceria da empresa que, em conjunto com a Felipa Xara-Brasil, fundei em 2016 – Xara-Brasil, Proença de Carvalho & Partners, sou actualmente Partner da Signium, multinacional americana com foco em serviços de Leadership Advisory.
De forma integrada, actuamos ao nível da liderança das organizações, recrutando, desenvolvendo e retendo os executivos de topo nas empresas.
Iniciei a minha carreira na Andersen Consulting (agora Accenture), tendo, depois, desenvolvido o meu percurso de consultoria em outras empresas, como a Heidrick & Struggles, em Portugal, e a Fesa, no Brasil. Adicionalmente, e durante 5 anos, fui Directora de Recursos Humanos do Grupo Brandia Central (grupo de empresas na área de branding), em Portugal, Angola, Moçambique e Brasil.
Ao longo do meu percurso profissional, tive a oportunidade de exercer funções dos dois lados da mesa – como consultora e como cliente –, o que me permite, hoje, entender bem melhor os desafios dos meus clientes.
Sou licenciada em Organização e Gestão de Empresas, pelo ISCTE, com especialização na área de Recursos Humanos, e certificada em Executive and Life Coaching, sendo membro do ICF – International Coach Federation.

Daqui a dez anos, qual será o cenário da indústria de recrutamento, em Portugal? Quais os principais movimentos / tendências que antecipa?
No actual mundo VUCA (volatile, uncertain, complex and ambiguous), é loucura (para não dizer irresponsabilidade) tentar antecipar em dez anos uma indústria. No entanto, algumas tendências conseguimos perceber.
Na nossa indústria, o tão falado work 4.0tem implicações fortes, quer ao nível do Executive Search, como do desenvolvimento das actuais lideranças.
Por um lado, as organizações, todos os dias, descobrem competências de que necessitam e que não sabem como incorporar ou integrar. Hoje, são determinadas competências e, amanhã, já serão outras. Como fazer com que a história e a experiência acumuladas nas organizações sejam compatíveis com as novas tecnologias e novos skillsdigitais, que todos os dias se desactualizam? Como compatibilizar três diferentes gerações, com diferentes expectativas, modus operandie ritmos descompassados, numa única organização? Como garantir que, na luta desenfreada pelo melhor talento, é a “minha empresa” a escolhida? Estes movimentos já estão hoje a acontecer, com tendência para se intensificarem nos próximos tempos, o que traz desafios enormes para a nossa indústria.
Por outro lado, muitos executivos de topo ambicionam hoje um tipo de relação laboral diferente da que experimentaram no passado, que lhes permita ter mais tempo livre e/ou dedicar mais tempo a actividades complementares, sejam elas profissionais, académicas ou pessoais. Desta forma, a contratação de executivos para projectos, e não para posições “sem termo”, ou em part-time, são tendências evidentes, no mundo corporativo. Há estudos que referem que, em 2020, (amanhã, praticamente) 50% da força de trabalho será constituída por profissionais liberais / freelancers/ empresários em nome individual / empreendedores. As organizações terão de se ajustar a esta nova realidade e, consequentemente, a nossa indústria também.

Quais são os factores críticos de sucesso que fazem de um determinado “player” um actor de primeira linha, nesta peculiar indústria?
Na minha opinião, um “actor de primeira linha” nesta indústria, como lhe chamou, combina em si um conjunto alargado de características:
Gostar de pessoas: o nosso dia-a-dia é integralmente passado com pessoas, a conversar com pessoas, a analisar informações de pessoas, a tirar referências de pessoas, a escrever sobre pessoas;
Networking: preocupação constante com o desenvolvimento e a manutenção de uma robusta rede de contactos, que permita, com facilidade, aceder a qualquer pessoa ou organização, no mercado (cada vez mais global);
Curiosidade: busca permanente por actualizar conhecimentos e por acompanhar as tendências e movimentações, em particular no mundo organizacional;
Conhecimento e experiência: o know-howacumulado e a “obra feita” são essenciais neste sector, quando se fala de um “actor de primeira linha”;
Capacidade de diagnóstico: entender o negócio do cliente, rapidamente perceber o seu contexto (e da indústria respectiva) e captar o(s) desafio(s) que se colocam;
Solution provider: para cada problema específico do cliente, desenhar a melhor solução (nem sempre, o recrutamento de um executivo é a melhor solução);
Resiliência e sentido de excelência: permanente insatisfação com o trabalho realizado até ao momento e motivação para continuar na procura incessante por melhores resultados – é sempre possível fazer melhor;
Trusted advisor: acho que sobre isto não há muito a dizer. Se os clientes não nos confiarem os seus problemas e os executivos não nos confiarem as suas carreiras, não seremos absolutamente nada! E a confiança constrói-se!

O mercado de recrutamento especializado passou por momentos menos felizes, nos anos mais recentes, fruto da menor actividade económica e do chamado ajustamento. Em seu entender, este processo contribuiu também para uma transformação do sector – se sim, em que sentido, o que mudou?
O mercado de recrutamento especializado ainda precisa de se ajustar. Quando entrei para esta indústria, há quase 18 anos, o mercado era claro – havia as empresas do top 5, umas quantas (não muitas) tier2e, depois, várias empresas de recrutamento (que não eram de recrutamento especializado). E todas elas se distinguiam de forma evidente.
Hoje, há uma imensa nebulosidade. O mercado, hoje, é constituído por inúmeras empresas e profissionais freelance, que todos os dias surgem com promessas de trabalho de excelência, a preços de saldo. E, infelizmente, dadas as políticas de contenção a que hoje muitas empresas estão sujeitas, os clientes acabam por escolher o barato, em detrimento do bom. E o barato, em particular neste sector, pode sair extremamente caro!
As boas notícias é que, neste processo de ajustamento como lhe chamou, os projectos se tornaram muito mais challenging. As posições ditas “convencionais” já não são o foco dos projectos de Executive Search, sendo pedido a este serviço que identifique, e muitas vezes até que desenhe, novos perfis e que antecipe novas necessidades das organizações. O processo tornou-se muito mais complexo, mas muito mais desafiante.

Que conselho daria a um jovem profissional de recrutamento especializado, com ambição de construir uma carreira e de fazer a diferença?
Que leia muito, que estude muito, que desenvolva os seus skills de comunicação e de relacionamento interpessoal, que aguce a sua curiosidade e que, se possível, faça o seu percurso numa “escola” de Executive Search. Felizmente, ainda há algumas óptimas referências no mercado (em Portugal e fora). Ah… e que experimente uma posição executiva numa empresa, que passe pela vivência de uma operação.